A Coluna e Baluarte da Verdade: A Importância da Doutrina na Formação Cristã

No primeiro manual de prática pastoral já escrito, o apóstolo Paulo define a Igreja como coluna e baluarte da verdade (1Tm 3:15). Para muitos dos que vão à Igreja hoje, uma coluna e baluarte da verdade não é necessariamente o que eles buscam quando estão procurando uma igreja.

A Coluna e Baluarte da Verdade: A Importância da Doutrina na Formação Cristã

Do livro Treinando Corações Ensinando Mentes - Starr Meade

No primeiro manual de prática pastoral já escrito, o apóstolo Paulo define a Igreja como coluna e baluarte da verdade (1Tm 3:15). Para muitos dos que vão à Igreja hoje, uma coluna e baluarte da verdade não é necessariamente o que eles buscam quando estão procurando uma igreja. A primeira preocupação é o calor da recepção, o estilo de música da igreja ou o número de atividades semanais para escolher. Fidelidade à doutrina bíblica está se tornando uma prioridade cada vez mais rara ao se buscar uma igreja.

O teste supremo de uma igreja, contudo, na perspectiva dos escritores do Novo Testamento, é este: esta igreja é coluna e baluarte da verdade? Ela está profundamente familiarizada com a verdade do Evangelho revelada nas Escrituras? Ela exalta a Palavra de Deus, dando-a lugar de proeminência em toda a sua adoração e em todas as suas atividades? Ela defende a verdade a qualquer custo, proclamando-a sem comprometê-la, neste mundo de confusão e falsidade? Ela conclama o seu povo a conhecer a Palavra de Deus com o fim de que vivam fielmente por ela?

A cada geração, o dever mais crítico da Igreja é sustentar e proclamar a verdade como foi confiada a ela pelo seu Senhor. Um aspecto importante dessa tarefa é a preparação diligente das crianças da igreja para que continuem a ser coluna e baluarte da verdade na geração seguinte. Deus chama a igreja de cada geração a “batalhar, diligentemente, pela fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 3). Quando nossos filhos nos substituírem como guardiões da fé, terão eles uma compreensão clara da fé que precisarão defender? Quando eles nos substituírem como baluartes da verdade, será que eles conhecerão bem o suficiente para articularem claramente e reconhecerem as falsidades?

Os homens sábios e piedosos de outrora entenderam a necessidade de se elaborar padrões de verdade e de doutrina cristãs. Eles viram o valor que tais padrões teriam ao apresentar os ensinamentos fundamentais da Escritura de uma maneira concisa e sistemática, e ao providenciar uma peneira pela qual todos os ensinos e ideias podem ser filtradas. Com grande cuidado e muita oração, eles trabalharam juntos para formular credos e confissões que definissem as doutrinas básicas da fé cristã. Cientes da importância de passarem essas doutrinas para seus filhos, eles também prepararam catecismos para a instrução dos mais jovens.

Um catecismo é simplesmente um guia para o ensino. É um livro de perguntas e respostas projetado para ensinar os princípios da religião. ”Catequizar” crianças é ensiná-las a memorizar as respostas encontradas em um catecismo para que, quando aquelas perguntas forem feitas, as crianças possam responder corretamente. Pelo fato de um bom catecismo ser conciso e profundo ao mesmo tempo, quando as crianças tiverem aprendido bem, o seu entendimento das doutrinas básicas da fé cristã pode ser testado e comprovado como sendo completo. Um catecismo excelente é o Breve Catecismo de Westminster. Com um formato conciso, ele dá às crianças os ensinamentos bíblicos fundamentais sobre Deus, as Escrituras, o Senhor Jesus Cristo, o Espírito Santo, a salvação, os sacramentos, os dez mandamentos e a oração do Senhor (N.T.: comumente chamada também de oração do Pai Nosso).

Antigamente, os catecismos eram usados rotineiramente. A igreja e a Família trabalhavam juntas para promover o ensino mais eficaz possível para os filhos que cresciam nos círculos cristãos. Os pai deveriam trabalhar com os seus filhos em casa, exigindo que memorizassem as respostas do catecismo ou memorizando-as juntamente com eles. As famílias discutiam juntas o significado das perguntas e respostas. Os pastores pregavam sobre os tópicos tratados no catecismo e sistematicamente visitavam cada família da igreja fazendo essas mesmas perguntas, a fim de conferir se os membros da família estavam aprendendo as respostas.

O pastor puritano Richard Baxter tinha como prática visitar cada uma das oitocentas famílias da sua igreja a cada ano, concentrando as suas visitas na instrução encontrada no Breve Catecismo de Westminster. Além de examinar as crianças e os adultos para ver o quanto eles conheciam do catecismo, ele também adicionava certas perguntas para ver se as respostas estavam sendo compreendidas. Então, ele continuava a sua visita encorajando todos os membros da família a viver à luz das verdade de cada pergunta memorizada. Baxter afirmava haver mais sinais exteriores de sucesso demolindo o reino das trevas no seio de sua igreja por meio desta prática do que por meio de toda a sua pregação pública a ele.

Infelizmente, a prática de se catequizar crianças têm perdido o prestígio, tanto nas famílias, como na igreja. Uma razão para isto é a fascinação que há hoje em dia por novas técnicas educacionais que enfatizam a experiência, a participação do estudante e a escolha de cada um. A memorização tem estado fora de moda. Contudo, o que eu consigo me lembrar melhor da minha infância é o que memorizei. A canção do ABC que todos nós cantamos quando temos ítens para listar alfabeticamente, as contas de multiplicação, as cantigas comuns de criança, e até os versos de poema de Shakespere que memorizei simplesmente porque eram belos, muito antes de poder compreender o que significavam – todos estes estão indelevelmente fixos em minha memória. Eu posso trazê-los à memória a qualquer momento em que precisar deles, confiante de que estarão ali para me servir.

Diz-se que, quando nós exigimos que os nossos filhos memorizem, eles irão apenas decorar sons e palavras sem sentido ou sem compreenderem. Certamente, nós fazemos um desserviço aos nossos filhos se insistirmos que eles memorizem palavras que eles não compreendem, enquanto nós falhamos em tomar o tempo necessário para discutir, ensinar e explicar os significados a eles. A solução, contudo, não é descartar a memorização como um método de ensino, mas fielmente prover o sentido correspondente ao que está sendo memorizado por meio da discussão e da explicação.

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Há, contudo, uma outra grave razão pela qual os catecismos têm saído de moda. É que a instrução doutrinária em geral, para qualquer um, mas especialmente para as crianças, tem se tornado impopular. Em uma tentativa de atrair os descrentes, a igreja tem se ocupado em providenciar coisas que o mundo acha atrativas. Ao fazer isso, ela tem perdido de vista o real propósito de ser “coluna e baluarte da verdade”. 

Do púlpito, o conforto, a inspiração e a “espiritualidade” são aceitáveis; contudo, a doutrina não é. Em uma tentativa mal orientada de manter a unidade a qualquer custo, o ensino doutrinário é empurrado para fora sob pretexto de que doutrina “doutrina causa divisões”. Visitantes da igreja criticam sermões que enfatizam a doutrina como não sendo práticos o suficiente, sem compreender que uma vida realmente transformada flui de uma mente verdadeiramente transformada/renovada. Ávidas para atender às demandas dessas pessoas, mais e mais igrejas oferecem mensagens aguadas, fáceis de ouvir e inspiradoras, mas nunca definem o Evangelho claramente. Em um número crescente de cultos e programas da igreja, o entretenimento está substituindo o ensino substancial da doutrina cristã.

Não há lugar onde estas coisas estejam mais aparentes do que nos departamentos infanto-juvenis da típica igreja norte-americana atual. Na minha década de serviço como diretora do ministério infantil de uma igreja local, experimentei muitos currículos e recebi diversas propagandas de outros. Em geral, os materiais promocionais coloridos e brilhantes prometiam “jogos melhores, novas atividades, experiências divertidas que seus filhos vão gostar de verdade”. Sem dúvida, não há nada de errado com “jogos, atividades e experiências divertidas” para crianças. Aqueles que amam crianças querem que elas tenham prazer em aprender. Contudo, quando todas as páginas de material promocional descrevem somente a diversão, enquanto o conteúdo do currículo é citado apenas em um canto obscuro do encarte, as prioridades estão claramente equivocadas.

As propagandas apelam para o que as pesquisas dizem que as pessoas querem. Quais são as prioridades da igreja para as crianças? A publicidade para os currículos infantis deixa a resposta bem clara. Que as crianças fiquem entretidas e se divirtam – esses são os objetivos principais aos quais todos os outros parecem estar subordinados.

Mesmo onde o ensino da Bíblia para crianças é uma prioridade, ensinar doutrinas bíblicas raramente o é. As crianças ouvem as mesmas histórias bíblicas repetidas vezes, quase sempre como lições morais de como se comportar. As lições típicas da escola dominical reduzem as histórias bíblicas a contos morais bem parecidos com fábulas de Esopo. O foco é no ser humano da história, que se tornou o personagem principal dela. Então o professor chega ao fim e conclui: ”E você deve ser como Davi e Deus te abençoará” ou “Você não deve agir como Acabe ou terá problemas”.

Quando as  histórias bíblicas são usadas dessa maneira, Deus fica na periferia da narrativa, como o gênio nos contos de fada, abençoando o ator humano por seu bom comportamento ou amaldiçoando-o por suas falhas. As crianças raramente aprendem a ver o próprio Deus como o personagem principal de cada história bíblica. Elas não aprendem a perguntar sobre cada relato que leem: ”o que essa história me fala sobre Deus?”. Elas nunca aprendem a ler todas as narrativas bíblicas à luz do propósito geral de Deus de redimir um povo para si mesmo. Tudo o que elas aprendem é: seja bom que Deus te abençoará; sejam mal e ele não o fará. Essa não é apenas uma representação falha do Evangelho, isso não é Evangelho de forma alguma! Que tragédia!

Deus em sua graça e condescendência encheu as escrituras com histórias e ilustrações concretas da verdade abstrata. Mas nós devemos usar as histórias bíblicas da forma como Deus planejou que fossem usadas. Ele a deu a nós pela mesma razão pela qual nos deu toda a Escritura – para que pudéssemos saber como ele, o único Deus e verdadeiro, é, e entender a salvação que ele providenciou para o seu povo por meio do seu Filho. As histórias da Bíblia ilustram doutrinas da Bíblia. Nós que trabalhamos com crianças devemos ser gratos por isso e usar as narrativas bíblicas para ajudar nosso filho a entender as doutrinas da nossa fé. Nós desperdiçamos as histórias da Bíblia quando as usamos apenas para moralizar ou equipar nossos filhos para vencerem as gincanas bíblicas.

A Igreja está equipando suas crianças para serem a coluna e baluarte na próxima geração? Vários anos atrás, eu ouvi uma transmissão de rádio fazendo entrevistas ao vivo com autores e publicadores cristãos em uma grande convenção cristã. Os entrevistadores perguntavam repetidamente aos participantes duas perguntas-chave: “O que é a justificação?” e “O que é o Evangelho?”. A maioria dos entrevistados provaram ser deploravelmente incapazes de dar uma resposta lúcida e bíblica para essas questões. Ainda assim o cristanismo é o Evangelho. O ponto principal de nossa fé é o pecado sendo justificado diante de um Deus santo. Essas são coisas essenciais para um entendimento da fé cristã.

Se esse entrevistados tivessem aprendido o Breve Catecismo de Westminster, eles teriam essa resposta pronta: "Justificação é um ato da livre graça de Deus, no qual ele perdoa todos os nosso pecados, e nos aceita como justos diantes de si, somente por causa da justiça de Cristo a nós imputada, e recebida só pela fé”. Tão simples e ainda tão profunda! Há alguma razão pela qual as pessoas deveriam esperar para irem a um colégio teológico ou seminário para aprenderem uma definição tão simples, tão básica para nossa fé?

Hoje muitas vezes nos contentamos com a palavra “Deus” e com os sentimentos calorosos a respeito dele. Em uma sociedade repleta de idéias errôneas acerca de Deus, nós falhamos em dar uma definição a uma palavra quando usamos. Ansiosos por incluir e pensar o melhor de todos, nos alegramos quando ouvimos aquelas palavras religiosas, assumindo que a pessoa que fala é uma de nós. Quando juntamos essa falta de distinção com nossa simpatia natural para com as crianças, somos ainda mais rápidos para assumir que as crianças são cristãs quando, na realidade, elas não tem nenhuma idéia do que é ser cristão.

Certo verão, em um acampamento cristão para crianças em situação de risco (famílias problemáticas), uma conselheira me relatou uma conversa que teve com um acampante de 10 anos de idade. “Eu lhe perguntei se ele já tinha pedido a Cristo para habitar em seu coração e ele disse que sim, quando tinha seis anos”, contou. Ela continuou me dizendo que eles estavam folheando uma Bíblia juntos quando ele viu a figura das três cruzes no Calvário. “Sobre o que é essa história?” o menino perguntou, curioso. O resultado dessa discussão com a criança foi um conforto para a conselheira, que estava certa de que o menino estava “salvo” por causa do que quer que ele tenha feito aos 6 anos. Fica evidente, porém, que nunca passou pela mente dela que, seja qual for a “decisão” que as crianças já tenham tomado, se elas não têm nenhum conhecimento sobre a crucificação de Cristo, não seria seguro concluir que elas são salvas.

Aqueles que se importam em passar o bastão da verdadeira história do cristianismo devem acordar para a importância de transmitir suas doutrinas com fidelidade para seus filhos. Não podemos depender das histórias bíblicas casuais e esporádicas e memorização de versículos, com esperança de que de alguma forma nossos filhos destilarão delas os importantes ensinamentos do cristianismo. Pelo contrário, devemos providenciar instrução doutrinária cuidadosa e sistemática. As crianças precisam de uma peneira pela qual possam passar tudo o que veem e ouvem. Devemos dar isso para nossos filhos enquanto eles ainda são jovens. A doutrina não pode esperar até que as crianças se tornem mais velhas, porque adolescentes têm que tomar grandes decisões para a vida. A base teológica na qual eles se apoiarão para tomar essas decisões, a cosmovisão bíblica, deve estar preparada.

O apóstolo Paulo chama Timóteo de seu “verdadeiro filho na fé”. Ele instruiu Timóteo com profundidade e fidelidade, e então o enviou para continuar o ministério que Paulo mesmo havia iniciado. É o que nós, como igreja, devemos cumprir nossa responsabilidade agora, para que sejamos capazes de dizer com seguranças, como Paulo disse a Timóteo, “Mantém o padrão das sãs palavra que de mim ouviste e com o amor que está em Cristo Jesus. Guarda o bom depósito, mediante o Espírito Santos que habita em nós.” (2Tm 1:13-14).


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Parte desse texto foi extraído do Livro: Treinando Corações Ensinando Mentes - Devocionais para família no Breve Catecismo de Westminster de Starr Meade.

Aqui o autor propõe a leitura das 107 perguntas e respostas do Breve catecismo de Westminster, sendo possível meditar em cada pergunta e resposta durante 6 dias da semana, assim tendo uma boa fixação das doutrinas essenciais da Palavra de Deus. Se você papai e mamãe estão perdidos e não sabem por onde começar a fazer devocional com seus filhos ou até mesmo individualmente, esse livro é excelente pois é simples e ao mesmo tempo profundo. Que nós possamos buscar com zelo a Palavra do Senhor e crescer em relacionamento, conhecimento e intimidade com o Senhor Jesus Cristo. 



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